Quando a alma constela
“Querida mamãe,
Desculpe-me por demorar tanto para escrever. Toda vez que eu tento escrever a você e ao papai, percebo que não estou dizendo as palavras que estão no meu coração. Estaria tudo bem se eu os amasse menos do que eu amo, mas vocês ainda são meus pais e eu ainda sou filho de vocês.
Tenho amigos que pensam que sou idiota por escrever esta carta. Espero que eles estejam errados. Espero que suas dúvidas sejam baseadas nos pais que os amam e confiam menos neles do que os meus. Espero, especialmente, que vocês vejam isso como um ato de amor da minha parte, um sinal da minha contínua necessidade de dividir minha vida com vocês. Eu não teria escrito, eu acho, se vocês não tivessem me contado sobre o envolvimento de vocês com a campanha ‘Save Our Children’ [‘Salvem Nossas Crianças’]. Isso, mais do que qualquer coisa, deixou clara minha responsabilidade em contar a vocês a verdade, que o filho de vocês é homossexual e que eu nunca precisei ser salvo de nada, exceto da crueldade e da ignorante piedade de pessoas como Anita Bryant.
Desculpe, mãe. Não por ser quem eu sou, mas pela forma como você deve estar se sentindo agora. Eu conheço esse sentimento, pois eu o senti pela maior parte da minha vida. Nojo, vergonha, descrença – rejeição pelo medo de algo que eu sabia, mesmo quando criança, que era tão básico à minha natureza quanto as cores dos meus olhos.
Não, mãe, eu não fui ‘recrutado’. Nenhum homossexual experiente foi meu mentor. Mas sabe de uma coisa? Eu gostaria que sim. Eu gostaria que alguém mais velho do que eu, e mais experiente do que as pessoas de Orlando, tivesse me dito: ‘está tudo bem, criança. Você pode crescer e ser médico ou um professor como qualquer pessoa. Você não está louco, doente ou endemoniado. Você pode se sair bem e ser feliz e encontrar paz com amigos – todos os tipos de amigos –, que não dão a mínima sobre com quem você se deita. Acima de tudo, contudo, você pode amar e ser amado sem se odiar por isso.’
Mas ninguém nunca me disse isso, mãe. Eu tive de descobrir sozinho, com a ajuda da cidade que se tornou minha casa. Sei que é difícil para você acreditar, mas São Francisco é cheia de homens e mulheres, héteros e homossexuais, que não consideram a sexualidade como medida de valor de outro ser humano.
Eles não são radicais ou esquisitos, mãe. Eles são caixas de supermercado e banqueiros e velhas senhoras e pessoas que acenam e sorriem para você quando você os encontra no ônibus. Suas atitudes não são condescendentes ou de pena. E sua mensagem é muito simples: sim, você é uma pessoa. Sim, eu gosto de você. Sim, está tudo bem você gostar de mim também.
Eu sei o que você está pensando agora. Está se perguntando: o que nós fizemos de errado? Como deixamos isso acontecer? Quem de nós o fez assim?
Eu não posso responder isso, mãe. A longo prazo, acho que eu nem me importo. O que eu sei é isso: se você e o papai são responsáveis por quem eu sou, então eu os agradeço com todo meu coração, porque é a luz e a alegria da minha vida.
…”
Trecho de carta escrita por um rapaz que se assume homossexual para os pais através da escrita. A carta foi lida em um evento inglês chamado Letters Live pelo ator Ian McKellen (http://www.independent.co.uk/arts-entertainment/art/news/watch-sir-ian-mckellen-read-powerful-coming-out-letter-a6855146.html – vídeo da leitura e carta completa
Observemos o mapa da próxima Lunação, que faz conjunção a Mercúrio em Câncer. O que gostaria de dizer à sua mãe, sua família, seu passado? Esta Lunação trará à tona toda emoção que a alma carrega e lidar com este sentimento muitas vezes resgatado de um passado pode ser tanto difícil quanto agradável, e servirá para mostrar o quanto também se está preso ou em piloto automático, descontente com a vida mas repetindo os mesmos padrões de gerações.
É chegado o momento de trazer para a consciência tudo o que realmente sente e é apenas revelado para os que são mais íntimos, ou que somente se resgata na intimidade de nossos quartos ou qualquer lugar que promova uma segurança e contato com a própria alma. Escrever ou falar o que sente será um ótimo exercício para tentar entender o que se passa internamente. Não é aqui um exercício de achar culpados, de apontar dedos para mãe, pai ou membros da família, mas identificar os anjos e demônios que lhe compõe, nomeá-los, pois só assim é capaz de lidar melhor com eles, sair do piloto automático e fazer escolhas mais conscientes.
A Lua Cheia, ápice desta Lunação, mostra a conjunção quase exata com Plutão em Capricórnio e o T-square que se configura entre Marte em Câncer e Júpiter em Libra. Os sentimentos estão querendo emergir e tentar abafar isso seria como tentar impedir que um um vulcão ativo entre em erupção, e quanto mais segurar, mais fortes ficarão e quando finalmente sairem poderá ser de forma destrutiva e causar mais danos do que se pode imaginar.
Onde se tem Câncer no Mapa existe uma forte conexão com o passado, com as raízes, com os padrões familiares herdados. O passado tem relação com o futuro e se reflete na forma como enfrenta e constrói a realidade, indicado por Capricórnio. A união de passado e futuro implica em mudanças no tempo presente. O que do passado precisa dar atenção, racionalizar mais e se desprender? Às vezes não se dá conta, pois é transmitido de geração por geração, mas basta uma situação drástica no presente para então perceber que existe algo sim de errado e o que levou àquela situação foram escolhas do passado. E muito provavelmente não são escolhas conscientes, pois o inconsciente domina, ele nunca dorme ou cessa e tem-se agora a oportunidade de conversar um pouco mais com esse inconsciente. Ao menos um sextil a Netuno existe neste mapa da Lua Cheia e é a oportunidade, através da sensibilidade, dos sonhos e até mesmo da veia artística, de ressignificar questões da alma que afetam essa relação passado e futuro e buscar, com Plutão, transformar e eliminar de forma prática (Capricórnio) o que se carrega, herda do passado, mas não é necessariamente do indivíduo.
Você pode não ter sucesso no amor e perceber que seus pais não tiveram sucesso. Mas isso é deles, não seu. Você pode ter dificuldades financeiras e perceber seus pais sempre viveram no limite, mas isso é deles, não seu. São muitos exemplos que podem surgir para ilustrar o quanto nos apegamos a conceitos que são do passado, constituem nossas raízes, mas que empacam o futuro que implora por renovação e renascimento. Enquanto inconscientemente assumir que tal qualidade é sua ela será manifestada na realidade, portanto devemos resgatar todos os sentimentos e olhar para um passado que pede para ser visto, para assim transformar o futuro através de escolhas mais conscientes e próprias. E nada adiantará culpar os pais, a família pelo que herdou, pois eles também estão nesse círculo vicioso e fazem o melhor que podem com as ferramentas que possuem e no lugar deles faríamos exatamente a mesma coisa. Também nada adianta se lamentar pelo passado, pois ele constitui a fórmula do seu momento momento presente. Mas quem disse que tal equação está finalizada? Há sempre espaço para ser quem realmente deseja ser e ainda assim manter o vínculo, o amor e a gratidão a quem nos deu a vida. E a melhor forma de agradecer é viver tal vida em sua plenitude.
Deixar um comentário